Daqui a algumas horas começa tudo de novo – diferente, espero. Mais um semestre de faculdade, rever as pessoas, os amigos, os conhecidos, os desafetos, as paixões mal resolvidas, a hipocrisia social, as caras novas e, quem sabe, alguém diferente, se possível interessante. "Repetir, repetir – até ficar diferente". Talvez devesse ir menos a faculdade: não me sinto bem naquele lugar, entre aquela gente. Talvez devesse ir mais: conhecer melhor as pessoas, e estudar mais. Talvez não devesse fazer nada disso, e mudar de planeta. Talvez devesse fazer tudo isso: ir mais, indo menos; operando de forma alienígena, alterado, alterando: alter-ação. Ser outro, sendo o mesmo, no lugar de sempre. O passado, bem, já foi tragado pelo tempo, que bateu tudo no liquidificador. Resta beber o que sobrou. Com um pouquinho de açúcar, quem sabe? Ou jogar fora, e bater outro, em outra velocidade, outros sabores. De novo. A vida é um liquidificador. Ou, como disse Bernardo Soares:
Vivo sempre no presente. O futuro, não o conheço. O passado, já o não tenho. Pesa-me um como a possibilidade de tudo, o outro como a realidade de nada. Não tenho esperanças nem saudades. Conhecendo o que tem sido a minha vida até hoje – tantas vezes e em tanto o contrário do que eu a desejara –, que posso presumir da minha vida de amanhã senão que será o que não presumo, o que não quero, o que me acontece de fora, até através da minha vontade? Nem tenho nada no meu passado que relembre com o desejo inútil de o repetir. Nunca fui senão um vestígio e um simulacro de mim. O meu passado é tudo quanto não consegui ser. Nem as sensações de momentos idos me são saudosas: o que se sente exige o momento; passado este, há um virar de página e a história continua, mas não o texto.
A idéia inicial não era essa. Contudo, começa a decantar o meu passado triturado, processado e liquidificado. Se eu era, hoje "sou-me". Quem decanta, canta, que seja (n)um canto qualquer, (n)um canto.
Another brick in the wall?
Wonderwall...
P.S.: a imagem acima é uma montagem a partir de foto original – Persona – de Thiago Barnabé.